Uma Natal quase sem Luz
O
casal Miles não sabe o que esperar da noite de Natal, mas eles sabem que será
uma data difícil de lidar. A nevasca que atinge e deixa a pacata vila isolada,
corta as esperanças de um possível reencontro com o filho para a ceia de Natal.
As
investigações da polícia apontam indícios de que Henrique está vivo, e a cada
pista, sentem que ele está bem próximo. Henrique fugiu de casa quando descobriu
que os pais estavam prestes a se separar. Achou na fuga uma forma de mantê-los
unidos por mais tempo.
Sra.
Sarah Miles, chegando aos trinta e cinco anos, diante de toda desestruturação
familiar descobre que está grávida, mas não conta ao marido por medo de ser
repreendida e por orgulho. Que tipo de mulher usa o filho que nem nasceu para
manter um casamento? É horrível para ela aceitar.
Depois
da fuga de Henrique, Sr. Ian Miles, se entrega aos vícios, sem ocupação, passa
o dia fumando charuto em frente a uma lareira. Uma parte da vinícola em que
trabalha foi fechada temporariamente devido às tempestades de neve. E a vida
segue sem graça; Ao olhar pela janela a cor predominante é o branco. O branco deve
representar paz, mas que nestas circunstâncias dava um ar nostálgico e desolador.
Toc
toc toc – alguém bate na porta da frente. Sarah, que está perdida em meios aos
seus devaneios assusta-se, e com uma ansiedade perceptível vai abrir a porta.
-
Pois não? – fala ao abrir uma brecha e ver um homem com fardamento policial.
- Sou Xerife Kennedy, tenho novidades. – foi bem difícil para ele concluir a frase sem tremer, está muito frio lá fora. – Se importaria se eu entrasse?
- Sou Xerife Kennedy, tenho novidades. – foi bem difícil para ele concluir a frase sem tremer, está muito frio lá fora. – Se importaria se eu entrasse?
Sarah
abre a porta e desculpa-se pelo mau jeito. Pede para que ele se acomode próximo
à lareira, enquanto ela vai buscar um chocolate quente.
-
Quer um charuto? – oferece Ian quando o Xerife se aproxima.
-
Sim, mas depois que eu tomar o chocolate que a Sra. Sarah ofereceu.
Ian
solta um suspiro que parece ter sido o último. Desolado ele estar.
-
Sabe Kennedy – há uma pausa, Ian olha para o xerife e prossegue - nos
conhecemos há dois meses, me sinto a vontade para chamá-lo assim – Xerife assente
– espero que sua visita hoje nos tragam boas notícias. Sinto falta dele, e
Sarah chora todas as noites – pausa para uma tragada - Estávamos passando por
uma crise, íamos nos separar, mas quando Henrique fugiu, tivemos que nos unir. –
Sarah aparece com a xícara de chocolate quente, mas nenhum dos dois nota sua
presença - Ela não aguentaria passar por tudo sozinha, e eu não conseguirei
viver sem ela. Meu filho percebeu isso antes de mim. Quero aquele molequinho de
volta. Quero agradecê-lo por não ter me deixado largar a mulher da minha vida –
os primeiros sinais de lágrimas começam a aparecer – passo o dia com meu
charuto por que tenho vergonha de olhar para Sarah e dizer o que ela representa
para mim. Fui criado assim, nunca vi uma demonstração de afeto de meu pai para
com minha mãe. Cresci achando absurdo o casamento deles, mas olha o que eu faço
com o meu. Olha o que eu faço comigo. E meu filho? Foi embora e não sei se vai
voltar.
Ian
abaixa a cabeça e começa a chorar. Sarah se aproxima, entrega o chocolate
quente para Kennedy, e abraça seu marido com todas as forças que ainda lhe
restam. Enxuga as lágrimas dele com doces e delicados beijos.
-
Runf Runf – Kennedy quer a atenção de vota, e tenta a tática de ‘limpar a
garganta’.
-
Pois não? – Fala Sarah com um sorriso doce nos lábios e lágrimas nos olhos.
- Como
eu disse, tenho novidades – há um breve silêncio, Sarah e Ian estam apreensivos,
não fazem ideia de qual tipo seria a novidade – Preparados?
O
casal Miles o olha assustado, tem medo do que ele está prestes a dizer.
-...
Achei o filho de vocês.
-
Como é? Isso é sério? Aí Meu Deus. Obrigada Senhor. Obrigada. Ouviu amor? Ele achou
nosso Henrique, nosso Henrique – a emoção toma de conta, choros e risos se
misturam e formam uma perfeita sintonia. E os abraços se tornam a melhor dança.
-
Cadê meu molequinho? Ele está bem? – pergunta Ian ao Xerife que está com uma
cara de que a notícia ainda não acabou - Por que o senhor está com essa cara?
Meu molequinho está vivo, não está? – os risos cessam, e a tensão volta a
preencher a sala.
-
Sim, Henrique está vivo, mas está muito mal. Ficou muito tempo exposto a essa
tempestade, creio que alguns dias sem comer e beber também. Está muito
debilitado.
-
Quero ver meu bebê. – fala Sarah pegando as chaves do carro e o casaco.
-
Ele não está na vila. – diz Kennedy por fim. - Tivemos que levá-lo para a
cidade, para que pudesse receber o atendimento médico.
Ian
parece não estar acreditando na notícia, depois de dois meses de espera.
Henrique está de volta.
-
Eu... Eu vou para a cidade. Não tem problema – Sarah já está saindo de casa
quando Ian a interrompe.
-
Vai para aonde mulher? Você não sabe dirigir.
-
Foi por isso que casei com você. Vem Ian, vem. Não quero esperar nem mais um
segundo para reencontrá-lo.
-
Calma Sra. Sarah – interviu xerife Kennedy – as camadas de neve ainda estão
grossas e há previsão para mais uma tempestade essa noite. Quando estava vindo,
o carro atolou três vezes. Minha sorte é que estou com mais dois companheiros
dentro do carro. Se o de vocês atolar, fica impossível sair.
-
Ótimo, nos leve até lá. Por favor. Sei que o senhor tem filho. Faço esse apelo
em nome dele. Por favor! – suplica Sarah.
- Por
favor, Kennedy, nos leve – Ian decide usar a emoção e fica no time da esposa.
-
Eu os levo, mas só por que vocês pediram em nome do meu filho. O que eu não
faço pelo Johnattan?
Seguem
viagem. A cidade fica a cerca de 100 quilômetros. Se com três pessoas no carro,
houve atolamento, com cinco então... Uma viagem que acontece em média em
1h30min, aconteceu em 3h50min devido aos seis atolamentos. Sem contar com o
frio que os açoitam quando descem do carro para dar um empurrão.
-
Boa Noite! Em que posso ajudar? – pergunta uma enfermeira quando é abordada por
Sarah e Ian.
-
Boa Noite! Somos os pais do Henrique Miles e gostaríamos muito de vê-lo. – Ian
toma à dianteira.
-
Venham comigo! Os levarei até o quarto.
O
hospital é pequeno, poucos corredores e está bem quieto, alguns pacientes recebem
alta para passar a ceia de natal com a família.
Seguem
por um corredor branco com umas minúsculas janelas que permitem ver o brilho da
cidade no Natal, luzes piscando, trânsito leve, e um Papai Noel gigante em cima
de uma loja de conveniência não para de desejar “Boas festas!”.
-
Chegamos. Fiquem a vontade. – diz a enfermeira antes de sumir por outro
corredor.
Ian
abre a porta e encontra Henrique de olhos fechados.
-
Oi meu amor – Sarah corre para abraçá-lo e beijá-lo – tudo bem?
Henrique
parece não se importar com a presença dos pais.
-
Oi filhão. Que bom te ver. – fala Ian, com muito entusiasmo na voz.
Henrique
continua imóvel.
-
Está certo rapaz, quando decidir falar comigo, chama. Vou sentar ali naquela
poltrona e ler aquele jornal.
Nesse
momento Sarah encontra um papel branco em cima do criado mudo no quarto. Está
escrito: “Para meus pais”. Sarah abre e
começa a ler
“Quando eu ignorá-los, mamãe vai sair
mexendo no quarto e vai encontrar essa carta. Saiba mãe, que não estou lhes
ignorando por que eu quero. Senti-me muito fraco, e pedi para a enfermeira me
dar caneta e papel. Só quero dizer que os dois meses que sumi, bem, eu não
sumi. Vi que você e o papai ficaram juntos, porém distantes. Você ficava a
maior parte do tempo na cozinha, e sempre que eu procurava por papai, o via em
frente à lareira com o bom e velho charuto na boca. Parece egoísmo de minha
parte, mas preferi vê-los assim, a separados. O tempo em que estive fora,
desbravando o mundo, tive certeza que para casa não voltaria mais, gostei de
ser um aventureiro, mas devo me lembrar de na próxima vida, se ela existir,
desbravar o mundo no Verão. No inverno é tudo branco e a felicidade das pessoas
é nostálgica. Mamãe, em uma das vezes em que estive em casa, vi você
conversando com os seus pensamentos, kkkkkkk achei engraçado. E sabe o que eu
descobri no seu monólogo? Vou ter um irmão. Mãe e pai, é uma pena que não terei
o prazer de tê-lo em meus braços. Sinto a morte, ela é fria e desoladora. Mas
não fiquem tristes, estou preparado para ela. Bom aventureiro que sou, devo
estar preparado para tudo. Mãe, não chora. Todo moribundo com um pé na cova tem
direito a ter desejos realizados. Bem, quero que você e papai vá naquele
restaurante que tanto amam, e tenham uma ceia de Natal digna de filme Hollywoodiano
da corte britânica. Se eu tiver um irmãozinho, será que ele poderia se chamar
Henrique? É só uma sugestão, não se sintam obrigados. Se for uma menininha,
Sarah Érica é um nome bonito. Tive uma vida feliz, ao lado dos melhores pais
que alguém poderia ter. Não se culpem por nada, apenas fiz minha parte para
tê-los unidos. Amo vocês, meus pais. Amo a Érica também.
Beijos
Henrique Miles”
Com
lágrima nos olhos, Sarah olha para o filho imóvel sobre a cama, e olha para
Ian.
-
Nosso filho não vai acordar! – corre, abraça o marido e desaba em lágrimas.
-
Como é? Ele só está dormindo meu amor. Olhe!
Sarah
mostra o bilhete, que estava amassado e encharcado de lágrimas. Ian começa a
ler, mas não consegue terminar. Chora, chora por não ter valorizado antes a
família que tem.
-
O que vamos fazer agora? – pergunta Ian – A vida acabou!
Sarah
entre soluços responde:
-
Não acabou! No fim da carta ele pede para irmos ao restaurante que amamos e
tenhamos uma ceia de Natal dos deuses. – suspirou e chorou descontroladamente –
Ele se foi sem saber que vamos ficar juntos, ele se foi sem saber que somos
felizes, ele se foi... Ele se foi para sempre. Meu Henrique. E agora temos que
ir a um restaurante e ter que fingir que isso não aconteceu.
Ian
a abraça mais forte, e chora silenciosamente.
-
Também não sei como faremos isso. – e esconde o rosto dentro dos fios de cabelo
da mulher.
-
Eu sei como vocês farão isso.
-
Hen... Hen... Filho! O que está acontecendo? – Sarah pergunta.
-
Soube que viriam me visitar, e queria ter a certeza que vocês estão unidos.
Necessitava saber que tudo seria diferente. O amor que os uniu ainda existe, e
vocês descobriram isso graças a mim. Venham, me agradeçam e amem... Não, vocês
já me amam. Venerem-me para sempre. – diz Henrique com um sorriso maroto nos
lábios e o brilho no olhar de quem conseguiu remendar os desgastes do tempo.
Os
três se abraçam apertadamente. Henrique já havia recebido alta. Vão os três
para o pequeno restaurante que tanto amam. A ceia não foi digna de filme da
corte britânica, mas foi cheia de encantos como as estórias da Disney.
-
Gostaria de propor um brinde – Sarah se levanta e começa o discurso – Os dois
meses anteriores, foram os mais difíceis de toda minha vida. Com um filho
desaparecido e um casamento beirando falência, não nego que tentei procurar a
morte diversas vezes, mas não a encontrei. Ainda bem. Deus tinha algo reservado
para mim e para minha família. – ela já tinha conseguido a atenção de todos do
restaurante - Meu filho Henrique com toda sua astúcia, descobriu o que estava
levando o casamento para o abismo, mas ao invés de nos falar o que era, ele
preferiu fugir e deixar que descobríssemos sozinhos. Hoje, véspera de Natal, ao
entrar na sala de casa, vejo meu marido fazendo uma declaração para mim. Mas
estava errado, ele estava falando para o policial. – Sarah rir, e passa a costa
da mão sobre os olhos, lágrimas natalinas de felicidade queriam participar do
momento - Era esse o problema. Tudo que deveríamos dizer para o outro,
falávamos para outra pessoa. Motivo, não sei. Vergonha talvez, as pessoas
ultimamente tem vergonha de demonstrar o que realmente sentem, vergonha de ser
o que realmente são. Descobrimos que o casamento estava salvo. Depois de uma
agonia sem fim, depois de pensarmos que nosso filho estava morto, eis que
ouvimos a sua voz. Filho, te amamos. Não teríamos conseguido sem você. Você é
um dos melhores presentes que Deus me deu. Sim, um dos melhores, por que são
dois mega presentes. – Ela olha para o esposo - Para de rir Ian, não estou lhe
incluindo. – Sarah e Henrique dão gargalhadas e Ian faz cara de desapontado –
Sim Henrique, ela se chamará Sarah Érica, ou Henrique Segundo, e por que não
Ian Júnior? – Ela fala olhando para todos no restaurante – Mas escolheremos
depois, neste momento, o que interessa é que esse bebê viverá em um lar cheio
de amor e harmonia, e se Deus quiser, virá para nós com muita saúde. É isso!
Feliz Natal a todos!
Todos
no pequeno restaurante a aplaudem. Ian e Henrique se levantam e abraçam Sarah.
-
Você está grávida mesmo? – pergunta Ian com tanta felicidade que pelos olhos
está transbordando.
-
Sim, estou – Sarah olha nos olhos dele e rir.
Ian
beija a barriga dela e em seguida dar um beijo na testa da esposa. Depois de
treze anos de casados, ele diz pela primeira vez:
-
Eu te amo, Sarah!
Thaynara Chryslan
NOTA: O conto acima foi o primeiro que escrevi em toda minha vida. O escrevi para concorrer a uma vaga em uma Antologia, mas infelizmente ele não foi selecionado. Decidi postá-lo para vocês, e quero a opinião sincera de todos.
Oi Taynara, tudo bem?
ResponderExcluirLindo conto de Natal. Engraçado, porque eu acho que essa época combina com pequenos contos.E Natal sempre combina com estes milagres de Natal. Adorei o conto.
beijos
Kel
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